Museus Regionais e Museus Locais - Museu Julio de Castilhos

Museu Julio de Castilhos - Foto de setembro de 2018 


Quando a professora Zita determinou que criássemos um blog como atividade obrigatória da disciplina História dos Museus e dos Processos Museológicos, eu, idilicamente, julguei que poderia postar a respeito de museus que eu conheci, além das postagens semanais da disciplina. É lógico que não deu tempo!

Essa é a última postagem relacionada ao conteúdo da disciplina. Pretendo, então, manter meu propósito inicial. Nas férias. 

É curioso que o último post da disciplina seja sobre o Julio de Castilhos. É nele que eu penso quando alguém diz a palavra "museu". Ele foi o museu que eu mais visitei com a escola. Eu o vejo quase todos os dias, pois fica a meia quadra do meu trabalho. 

Na aula, a convidada Roberta Madeira de Mello nos falou sobre imaginário e representação das coleções do Julio relacionadas aos povos originários de 1901 a 1958. Povos originários. Muita coisa mudou desde as minhas visitas escolares ao Julio nas décadas de 1970 e 1980. Sou da geração que usava cocar improvisado e pintava o rosto com têmpera para comemorar o dia do índio no colégio. Quem era o índio para nós? Um ser exótico, do passado, que não falava a nossa língua. Mas que era festejado uma vez por ano. Por quê? Não sabíamos. 

Museu Julio de Castilhos - Foto de setembro de 2018


Roberta nos explicou que as coleções relacionadas aos povos indígenas eram, em um primeiro momento, associadas à história natural. O Museu Julio de Castilhos foi criado em sintonia com os museus de ciências do século XIX, como o Museu Nacional, o Museu Emílio Goeldi e o Museu Paulista (POSSAMAI, 2014, p. 268) e a visão dos objetos da cultura indígena estavam de acordo com a formação e a visão de ciências do seu primeiro diretor, Francisco Rodolpho Simch (1877-1937). Em 1925, Alcides Maya (1878-1944), nomeado novo diretor do museu, passou a dar ênfase à história. O acervo indígena passou, então, a estar vinculado, além da história natural, à história propriamente dita. Mas desde que essas história estivesse em interseção com a história do homem branco, como é o caso dos objetos de arte missioneira. Durante o Estado Novo, a partir de 1939, Emílio Kemp (1874-1955) passou a dirigir o museu. Inciou uma fase de ênfase pedagógica, com a promoção de visitas guiadas de escolas, exposições itinerantes e doação de duplicatas do acervo (inclusive de material indígena, como comentou Roberta) para escolas (NEDEL, 2005, p. 103-104). Em 1952, Dante de Laytano na direção foi responsável por diversas mudanças. Nedel nos explica que, apesar dos parcos recursos destinados ao museu, "a dinamização das atividades tivesse sido alcançada graças ao acionamento dos vínculos pessoais e profissionais do diretor, àquela altura já um intelectual bastante conhecido dentro e fora do Rio Grande do Sul" (NEDEL, 2005, p. 105). Laytano tinha uma proposta de complementariedade entre o histórico e o folclore e chegou a tentar adquirir uma coleção etnográfica relacionada aos açorianos (NEDEL, 2006). Roberta nos explicou que, apesar de visão bastante mais complexa de Laytano, as coleções indígenas continuaram a ser tratadas a partir dos mesmos códigos: primitivo em oposição a civilizado e povos ligados ao passado, nunca ao presente. 

Sobre isso, um colega fez uma pergunta muito interessante: se existe contato entre povos indígenas gaúchos e o Museu Julio. Roberta disse que isso ocorre em outros estados (como vimos no Museu Emílio Goeldi), mas não aqui no Rio Grande do Sul. Por quê? Saí com essa inquietação da aula e da disciplina de História dos Museus e dos Processos Museológicos. Aliás, não somente com essa, mas com várias outras, pois é para isso que estamos na universidade. 

Museu Julio de Castilhos- Foto de setembro de 2018


Bibliografia

NEDEL. Letícia Borges. Breviário de um museu mutante. Horizontes Antropológicos, Porto Alegre, ano 11, n. 23, p. 87-112, jan/jun 2005. Disponível em: https://www.scielo.br/pdf/ha/v11n23/a06v1123.pdf. Acesso em 6 de novembro de 2020. 

NEDEL, Letícia Borges. Da coleção impossível ao espólio indesejado: memórias ocultas do Museu Julio de Castilhos. Revista Estudos Históricos, Rio de Janeiro, v. 2, n. 38, p. 11-31,  Disponível em: http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/reh/article/view/2265/1404. Acesso em: 06 Nov. 2020.

POSSAMAI, Zita. Colecionar e Educar. O Museu Julio de Castilhos e seus Públicos. Varia História. Belo Horizonte, vol. 30, nº 53, p.365-389, mai/ago 2014. Disponível em: https://www.scielo.br/pdf/vh/v30n53/04.pdf. Acesso em 6 de novembro de 2020. 


 


 

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